Lisboa, 5/8/1965
Meu querido: (…) já quase deixava de esperar
notícias de bordo (…). [resposta ao meu aerograma enviado do Funchal] As
tuas palavras de hoje, meu amor, vieram colocar mais um sinal, mais um ponto
positivo na minha vida que tem sido nestes dias tão monótona, tão sem
interesse. Vieram acordar-me deste letargo em que mergulhei sem forças para
dele sair, desde que os teus pais me deixaram.
Foram embora domingo à tarde. Parecia-me que a
tua mãe ia mais bem-disposta, mais calma e mais conformada. Aqui passou o tempo
mais ou menos animada, parecia-lhe, dizia-me ela à partida, que ainda estava
junto de ti. Eu sentia o mesmo. Tens uma mãe encantadora, meu querido. Eu
fiquei deveras maravilhada com ela, com as atenções que me dedicou. É bastante
justo o amor, a dedicação, a admiração que lhe votas, (…). Eu farei tudo para
lhe amenizar a dor, a saudade pela tua partida. Devia ter recebido uma carta
minha a participar-lhe que não ia lá passar o domingo como tinha prometido. (…)
mas eu não posso, embora tenha a 2ª feira livre até às 14 horas para podermos
assistir ao juramento e investidura do Presidente da República. [Em 9/
VIII/1965, Américo Tomás inicia o seu 2º mandato como PR (1965-1972).]
(…). Consegui na hora da despedida sorrir-te,
pôr nesse sorriso toda a minha esperança e toda a confiança no belo futuro que
havemos de ter mas, interiormente, a minha constituição física ressentiu-se com
a excitação de que depois fui tomada. Já é natural o que agora me aconteceu,
quando me excito, por isso evito as viagens porque experimento um mal-estar,
uma indisposição horrível. (…).
Olha por ti. Não desanimes, (…) é preciso que
no nosso espírito haja um apoio, uma segurança, alegria indestrutível. Tudo
passará, (…). E tu regressarás. (…). Acredito-o. Haverá nestes anos muita dor,
muitas saudades, momentos de desespero mas para vencermos tudo isso e o mais a
que estamos sujeitos é preciso que tenhamos um ponto de apoio, qualquer coisa
pela qual teremos de vencer tudo para a possuir. (…). Nós somos capazes de
transformar em triunfo todas as dores, fracassos, decepções. (…), apesar de
tudo e contra tudo o que se lhes oponha. (…). Com esta segurança, querido, com
esta força que nos guia podem vir desgraças, desânimos, decepções que sempre
fica na nossa alma uma réstia de luz, de paz e alegria, capazes de suplantar
todas as dores.
(…) aguardemos confiantes a hora do encontro.
(…). Beijo-te e abraço-te, meu amor querido.
Só e sempre tua, N.